Asdrubal e as almofadas

O que Asdrubal gostava mesmo era de almofadas. Um gosto tão peculiar que chegava a colecioná-las. Mas não se trata de uma coleção descompromissada, pela junção de diferentes exemplares, a coleção era meticulosa o bastante para que ele descreve em detalhes mínimos o tecido, a maciez e o volume de cada uma delas.

Outro fator curioso é que Asdrubal as guardava num comodo especial dentro de casa, uma sala com o assoalho forrado de almofadas. O comum é que as pessoas preenchessem as suas salas com sofás e algumas almofadas. Mas nosso colecionador tinha uma teoria própria: sofás são desconfortáveis, um lugar onde só podemos sentar e observar a nossa volta. Almofadas não, são variadasm sortidas, especiais. Nelas se sentam, se deitam, se abraçam. A demonstração mais perfeita da palavra "conforto".

Certa manhã depois de um café pequeno e um pão com manteiga sobre suas fofas acomodações. Um anseio recorrente veio no peito. No peito? Que exagero! Sim querida, no peito. Asdrubal precisava de uma nova almofada.

Estava decidido, levantou-se e saiu à caça de uma nova peça para a sua coleção. O mais interessante é que ele desenhava no pensamento as particularidades de cada almofada nova que adquiria. Esta sim, seria diferente das outras. Ou não, apenas mais uma almofada.

Levantar daquele estado contemplativo - quase um sono leve - era penoso. Cada movimento novo, de cada parte do corpo lhe parecia dolorosa. Atravessar os outros aposentos da casa era como um desafio com obstáculos. Mas todo este desconforto se resumia a um só objetivo: a procura.

Procurava nos lugares mais improváveis por mais uma querida e confortável parceira de deitar, sentar, abraçar, chafurdar e outras adjacências. Olhava em outros jogos de sofá, em pilhas avulsas. Bendito seja o vendedor que o atendesse no momento em que ele a encontrasse. Era quase um apego afetivo, não importa a que preço, ele ia levar.

No caminho para casa Asdrubal a abraçava com carinho, toda embrullhada junto ao coração. E é aí minha querida que uma ligação diferente se estabelecia um laço entre os dois. Não havia outras peças que tirassem a atenção para a nova aquisição. Uma cegueira que o impedia de enxergar o exagero de fofuras e extravgâncias que tinha naquele cômodo.

Ao chegar em casa, chegava o momento de decidir onde ficaria a nova almofada. Mas a decisão era quase sempre rasa e quase aleatória. O que realmente importava era descobrir a que parte do corpo aquele quadradinho confortável dava mais aconchego. Punha atrás da cabeça, deitava de lado, de bruço. Ainda não. Colocava nos pés, cruzava uma perna sobra a outra. Ainda não. Trouxe para as costas na região anterior ao tórax, mais ou menos onde fica deitado o coração, sabe?

Agora sim, que perfeição, que delícia. Daqui não levanto mais, dizia ele. Durante o descanso pensava: Para que existe a casa toda, se este é o cômodo mais agradável?
Que dúvida tola! Mas, naquele estado de repouso, parecia a mais perspicaz coerência.

A surpresa é que o sossego daquele cômodo ia sendo perturbado, o peso do corpo e do coração de Asdrubal comprimiam o enchimento da almofada que ia se tornando cada vez mais dura. Quanto mais dura, mais desconfortável e mais próximo da dureza fria do chão.
Maldita inquietude que dava nessa hora. Incomodozinho petulante.

Só havia uma solução, ele arregalava os olhos resolvendo o problema, surpreso com uma solução que parecia nova, quem sabe conveniente, dizia: Preciso de uma nova almofada para forrar esta sala.

Nenhum comentário:

Postar um comentário