Sem título


Sei que é tarde, mas queria escrever algo sobre você. Sugestões?
Poderiam ser alguns versos, um punhado de estrofes ou até uns refrões.
No entanto, nenhum deles descreveria a ousadia do que penso lhe escrever.
Tampouco compreenderia o que tento lhe dizer.

Um algo que não sei como definir e só o silêncio poderia exprimir.
Uma batida leve e frouxa de coração, um franzir de sobrancelhas,
eu sei lá, só preciso de um dia pra te contar.

Olhares anônimos


Oi, meu nome é... Não importa meu nome. Fazem dois dias que não cruzo um olhar. Talvez fosse um vicio, um cacoete, uma mania. Já não me lembro quem mandou eu me tratar. Cruzava olhares compulsivamente, a cada belo par de olhos a ansiedade me fazia sucumbir a aqueles olhares. 

Não fazia a menor diferença a moldura, se era gorda ou magra, mais velha ou mais nova, só mirava os olhos e em quantos imbróglios me meti. Me admirava o fato das pessoas não apreciarem a doce arte de cruzar um olhar. 

Quanto mais de doçura cabe naquele olhar? Mais um pingo e transbordaria. Via olhos cansados de tentar enxergar o horizonte e tinha também os olhos vivos de quem fotografa cada instante. Olhos molhados que olhavam baixo procurando uma razão, olhos que só passeavam pela multidão sem intenção. Eu documentava cada um destes no meu celular e passava noites em claro a procurar.

Não havia olhar mais doce que aquele. Procurei ajuda em outros sentidos: tentava ouvir as conversas, tentava abraçar as pessoas, mas nada cobria a falta de açúcar no café do meu olhar, que permanecia acordado e amargo, fissurado em procurar. 

Se eu bebesse, estaria em coma alcoólico. Se fumasse, teria câncer de pulmão. Só quero mais um dose. Mais um segundo para pousar meus olhos naqueles e tudo então fazer sentido, isso não é meu vício. É só um simples pedido.

Outros carnavais


O terno branco de linho veste minha imaginação.
Minhas palavras quase saem com os trejeitos de um bamba.
É realmente uma pena que este texto não seja um samba.
Gostaria que fosse canção, quem sabe enredo, mas só pode ser exaltação.

Mas que belo malandro eu seria, alinhado ao estilo noite e dia.
Um gingado impecável que fariam as mulatas suspirarem nas janelas.
Enquanto não vou aos botequins, meu verso é que se alimenta delas.
A nenhuma malandragem me atreveria, mas que belo malandro eu seria!

Exaltando uma aquarela pintada no chão da quadra da escola.
Galanteios viris nunca saíram da minha boca embriagada de noite boêmia,
Não consigo olhar o estandarte nas mãos da porta-bandeira.
Ao sagrado pavilhão que representa o pulsar da bateria, blasfêmia.

Sou isso que sou e nada mais poderia. Mas que belo malandro eu seria.
Neste carnaval já não sei se visto ou se sou fantasia, 
nem sei jogar ronda, me viro mal no bilhar. Fico aqui da arquibancada a suspirar.
Belisco a bunda da mulata? Nem caberia. Pega mal a quem não sabe como beliscar.

Se bebesse cerveja, talvez não aguentasse dois copos. Fico tonto.
Sou mesmo tonto de achar que a vida de malandro eu levaria.
Não batuco em caixa de fósforos, nem fumo. Tem fogo? Não, companheiro.
Esta noite me embriago de solidão, imaginando minhas traquinagens.

Depois que passar a escola pela passarela, 
vou suspirar meus tempos de malandragem que nunca foram
e me perguntar: Será que não queria ser malandro só por causa dela?
Hoje minha imaginação veste terno de linho branco.